Minha saudosa avó comentava que tinha muito medo de chuva com raios e trovões. Eu via certo exagero naquele pavor todo que ela dizia sentir e me gabava dizendo que eu mesmo não tinha medo disso não. Todavia, com a minha mudança para Teresina, esse meu parecer mudou da água para o vinho, ou seria melhor dizer: da segurança para medo...No natal de 2003 tive a minha primeira experiência de medo provocado por uma tempestade com descargas elétricas e trovões. O rimbombar desses era escandaloso e a sucessão rápida daqueles na atmosfera, fazia o céu piscar. Nunca mais esquecerei as impressões daquela noite em que passei a concordar com a minha avó. Entretanto, quando eu pensei que havia presenciado a pior das tempestades, eis que na primeira quinzena de novembro de 2007, Teresina se confirma mais uma vez a meus olhos como a "Chapada do Corisco". Era próximo da meia-noite quando acordei com um barulho estrondoso. Atordoado ainda, notei que se apagara a luz do quarto e, segundos depois, outro estrondo poderoso varou a noite. Até então não percebera que estava chovendo e a primeira coisa que me veio à cabeça para explicar o que estava acontecendo foi que se tratava de um acidente com a rede elétrica local. A essa altura, minha esposa já havia se refugiado nos meus braços, à procura de proteção. Pedi que ela se acalmasse, mas ela não conseguia conter o pavor que lhe tomava conta. Instantes depois, quis sair do quarto, para saber o que estava sucedendo, de fato. Pedi que ela ficasse, mas ela teimou em me acompanhar. Àquela altura, sua cabeça estava atordoada pelas mais temíveis explicações para aquelas duas explosões. Uma delas, escatológica, apontava para a consumação em andamento do Armagedom: "Deus está nos punindo", advertiu ela, entre o receio e o pavor. "Foi um avião que caiu", disparou em seguida, como que tentando adivinhar a ocorrência. Enquanto nos encaminhávamos para a sacada do apartamento, ela dizia que um meteoro havia caído. Eu reconhecia a estranheza da situação e o medo que ela inspirava em minha esposa, todavia estava tomado de serenidade, passado o susto primeiro, e continuava a alimentar a tese de fogo na rede elétrica. Então conseguimos, antes de chegar à sacada do apartamento, divisar o barulho singular da chuva. De olhos acesos como faróis, deitamos a vista atentamente sobre as redondezas da nossa habitação. Não distinguimos claridades de fogo, nem fumaça. Não se tratava de um punitivo divino em retaliação aos desvarios da humanidade, em consonância com as Escrituras Sagradas, como chegou a crer minha esposa. Nada de avião quedado, nem meteoros desvairados que abandonam suas órbitas seduzidos pela irressistível gravidade terrestre. Aquilo tudo foi pavoroso para ela e de princípio atordoante para mim, precisamente porque era apenas uma tempestade e nós não havíamos chegado a acreditar, até aquele momento, que um fenômeo atmosférico pudesse gerar tanto barulho como foi aquele produzido naquela noite por duas estridentes trovoadas. Tudo esclarecido, a chuva continuou a cair, sem mais trovoadas dignas de menção, na noite que piscava, deixando entrever, à vista rápida, sua bela face.
Nenhum comentário:
Postar um comentário