Um dos aedos piauienses por que tenho grande predileção é Mario Faustino. Dono de uma lírica "politonal e reflexiva", o poeta consegue "transfundir os motivos lírico-afetivos em temas universais" de forma peculiar. Desencarnou em 1962, com 32 anos de idade, vítima de desastre aéreo.
Transcrevo abaixo alguns de seus poemas de que mais gosto.
EGO DE MONA KATEUDO
Dor, dor de minha alma, é madrugada
E aportam-me lembranças de quem amo.
E dobram sonhos na mal-estrelada
Memória arfante donde alguém que chamo
Para outros braços cardiais me nega
Restos de rosa entre lençóis de olvido.
Ao longe ladra um coração na cega
Noite ambulante. E escuto-te o mugido,
Oh vento que meu cérebro aleitaste,
Tempo que meu destino ruminaste.
Amor, amor, enquanto luzes, puro,
Dormido e claro, eu velo em vasto escuro,
Ouvindo as asas roucas de outro dia
Cantar sem despertar minha alegria.
DIVISAMOS ASSIM O ADOLESCENTE
Divisamos assim o adolescente,
A rir, desnudo, em praias impolutas.
Amado por um fauno sem presente
E sem passado, eternas prostitutas
Velavam por seu sono.Assim, pendente
O rosto sobre um ombro, pelas grutas
Do tempo o contemplamos, refulgente
Segredo de uma concha sem volutas.
Infância e madureza o cortejavam,
Velhice vigilante o protegia.
E loucos e ladrões acalentavam
Seu sono suave, até que um deus fendia
O céu, buscando arrebatá-lo, enquanto
Durasse ainda aquele breve encanto.
ONDE PAIRA A CANÇÃO RECOMEÇADA
Onde paira a canção recomeçada
No capitel de acanto de teu lar?
Onde prossegue a dança terminada
Nas lajes de meu tempo de chorar?
Rapaz, em minhas mãos cheias de areia
Conto os astros que faltam no horizonte
Da praia soluçante onde passeia
A espuma de teu fim, pranto sem fonte.
Oh juventude, um pálio de inocência
Jamais se estenderá sobre outra aurora
Mais clara que esta clara adolescência
Onde o lupanar da noite hoje devora:
Que vale o lenço impuro da elegia
Sobre teu rosto, lúcida alegria?
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