sábado, 25 de outubro de 2008

Reter o bem

É muito comum malsinar os fatos e reprovar as outras pessoas antes de qualquer exame sério das situações que se apresentam. Parece haver uma espécie de complexo emocional que distancia da realidade quem assim age, dilatando o desentendimento e diminuindo a abrangência do círculo de suas boas relações.
É hábito de muitas pessoas apontar seus olhares perversamente críticos sobre acontecimentos que envolvem seus semelhantes e dispararem palavras dispensáveis, numa verdadeira e estéril verborragia. Podemos facilmente identificar, entre os que envidam essa atitude menos feliz, aqueles que se reputam como salvadores mas que, em verdade, se submetidos a situação a que se referem, no exato lugar das pessoas que criticam, fariam do mesmo jeito, senão pior. A opinião popular geralmente se movimenta através de impulsos desenfreados.
Mas, por que as condenações apressadas? Por que tanta crítica destrutiva? No tumulto da vida, atitude salutar é a de quem tem prudência no exame de qualquer situação e o faz com imparcialidade: esse é o caminho mais reto que nos conduz a integração com o propósito de busca do esclarecimento.
Além disso, não há nenhum mal em procurar reter o bem nas situações que nos são postas ao crivo.

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Indagações

Por que muitas pessoas iniciam a prática do bem, mas quando aparece um espinho de ingratidão que seja dos seus semelhantes, elas proclamam a falência dos seus própósitos de bem-fazer?
Por que há pessoas que enfeitam a zona intelectual de bons princípios, mas estes não lhes penetram o âmago do coração?
Por que demoramos tanto a renovar nossas atitudes mentais para melhor?

sábado, 18 de outubro de 2008

Esse mundo em que vivemos é mesmo - e infelizmente - o palco obscuro de muitos dramas. Todos os dias nos deparamos com notícias ruins que inspiram tristeza. Violências e injustiças de toda sorte ocorrem continuamente em todos os lugares e de forma democrática. Difícil é não conhecer alguém que nunca tenha sofrido as consequências de uma violência ou de uma injustiça, as quais vemos chegar cada vez mais perto de nós.
Diante desse quadro, uns ficam perplexos enquanto outros, indiferentes. Esse último comportamento pode ser explicado, dentre outras causas, pela ultraexposição desses casos nos meios de comunicação: ao se depararem frequentemente com ocorrências dessa natureza, as pessoas vão perdendo a capacidade de indignação. Os que ficam perplexos indagam: por quê?
A
resposta a esse questionamento envolve muitas causas interrelacionadas. Abstendo-se da menção aos fatores econômicos, políticos e sociais gerais que também concorrem como determinantes na construção desse panorama preocupante, peço permissão para me deter numa breve análise do comportamento humano individual. Afinal de contas, no que pese a densidade das variáveis sócio-político-econômicas, o ser humano individual, tomado subjetivamente, é o primeiro responsável por suas ações, já que possui livre-arbítrio.
Por que o homem não usa o seu livre-arbítrio para o bem? Por que ele comete injustiças e violência contra o seu semelhante? Uma prudente linha de respostas a essas indagações pode ser traçada fazendo-se menção ao fato de o homem poder ser considerado um animal com instintos, impulsos, desejos menos felizes. Quero dizer que o homem, infelizmente, ainda não se deixa governar pela razão, muito embora tenha plena capacidade para tal. Para nosso lamento, não pudemos constatar, ainda, o pleno amadurecimento da racionalidade humana, ainda que passados quase três séculos do movimento iluminista irradiado a partir da França.
Somente quando o homem se deixar governar efetivamente pela razão é que teremos um mundo com menos injustiças e violências. Por essa época, o homem terá atingido a autoconsciência e, portanto, um domínio mais pleno no campo das ações que leva a efeito.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Dia das crianças

Ganhei um presente no Dia das Crianças. Sou mesmo um menino, hoje como antigamente. Até quando vai esse menino? Até o leito de morte? Até depois da morte? Esse menino passeia pelo tempo desde que nasceu... Dorme como menino na noite, nos braços de Orfeu. Perambula olhando brinquedos... Tem sonhos, tem medos. Esse homem é um menino ou esse menino é um homem?
...
Há reminiscências suspensas
No ar frio que tempera a manhã.
Lances insepultos, luzes do passado,
Estão atrás das árvores beijadas de orvalho
Estão na terra molhada
Que aguarda uma passada.
Choveu no escuro
Na noite passada
E hoje a passarada
Amanheceu cantando feliz
Sacudindo das penas
O frio da noite ida.
Vão em revoada.
A treva dissipou-se para eles
Que carregam lembranças nas asas
Passeando-as pelo espaço.
A manhã de hoje
Parece a manhã
De um dia perdido no tempo
Manhã de infância,
Casa de palha, verde fechado
Frescura de café, pintinhos ciscando no quintal,
Aromas de curral, areias...
Ah! Lembranças inocentes
Impressas nas veias!
Todas vão embora...
Vai-se a alma do tempo
Entre a bruma dissipada
Pelos primeiros raios do sol.
...
10.10.2008

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Eu imortalizei muitos lances do passado. Outros prefiro olvidar por completo: dou-lhes aos braços do fogo do tempo, para que os incinere. Do que passou, ficam apenas as boas lições que, à guisa de sementes, espero frutifiquem para o bem. Todo dia, eu sou um pouco igual e um pouco diferente do que fui no dia que o sol deixou pra trás. Não me enlaço à magoas, ódio não tenho de ninguém. Não penso na morte, esse ente que a gente sempre aguarda para um futuro distante, mas que pode estar logo ali, traiçoeiramente ali, à cata de qualquer um de nós. Eu deixo a morte com a morte. Aliás, o conceito que tenho desse evento é substancialmente diferente daquele que muitas pessoas tem. Mas eu não vou discutir isso agora. Prefiro lembrar da areia da praia. Da corrida na praia. Do céu na praia. Do vento salgado da praia. Opto pela lembrança do sorriso dos meus filhos, da culinária da minha esposa, dos braços profundos da minha avó que o tempo levou. Contemplo a vida passeando pelas recordações boas, comparo o que fui e que sou hoje: que surpresa, o tempo existe!
...
Ilha remota, tal sonho perdido,
Adejada apenas
Pelas aves do mar
Bafejada apenas
Pelo sopro do sal
Recolhido em teu mistério
Jaz porto natural
De onde partem as ilusões
Que rumam, sem rumo
Navegam, sem remo
No mar pelo mar
No mar espelho do céu
O céu ungido de mar
Que assiste ao chicote das ondas
No seu tépido marulhar...
Que vê
A saudade embarcada
A incerteza embarcada
A semente da flor atirada
Ao fundo do mar...
Mas é preciso
Amar o mar amar o mar amar o mar
De um amor
que vibra
Sem aportar
No vazio das dúvidas
Do tempo que sopra o destino
Sem parar sem parar...
...

05.10.2008.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

...
Não é possível divisar os espelhos da noite
Nem a chaga aberta no tempo
Nem o pranto expelido pela madrugada.
O calor desce dos corpos em cachoeira
Corpos mudos, sem dor
Corpos surdos entre espectros silentes.
A agonia espalha-se com o escuro
Despedaçada em ecos do passado.
Não há presente, nem futuro
Fluindo entre a névoa invisível na treva.
Não há gleba, sangue na terra
Vento perdido, escondido na serra.
Ninguém escolhe o norte, nem o sul
Pois a lépida estrela não segue à boreal,
O tépido cometa não ruma ao austral,
Vagam perdidos,
Como os sinais sombrios
Angustiosos e frios
Que a noite sem relâmpagos fabrica.
...

30.09.2008.